Quem sou eu

Minha foto
Advogado, Membro da Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da OAB/RJ, Jornalista, Consultor de Políticas Públicas e Gestor em Segurança, Cursou Psicologia Jurídica na UERJ, Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino - Buenos Aires – ARG; Oficial da Reserva do Exército.

23 de agosto de 2005

Evolução Histórica da Legislação Menorista

Foi a partir de 1891, com o Decreto 1.313 que a infância se tornou objeto de discussão jurídica no Brasil, sendo criadas leis para regulamentar o trabalho do menor visando absorvê-lo na indústria que crescia assim também foram criadas leis para punir aqueles que não se enquadravam nas regras sociais. Foi então que surgiu a palavra “menor” no vocabulário corrente, que definia infância pobre.

Em 1927, é criado no Brasil o Primeiro Código de Menores da América Latina.

Em 1934 chega a Constituição, proibindo o trabalho infantil de menores de 14 anos sem permissão judicial, trabalho noturno aos menores de 16 anos e, nas indústrias insalubres aos menores de 18 anos.

A Constituição de 1946 manteve as proibições estabelecidas na Carta de 34, ampliou para 18 anos a aptidão para trabalho noturno e proibiu discriminação salarial por idade.
Em 1967, durante o regime militar foi outorgada uma nova Constituição, que diminuiu a idade para trabalho infantil de 14 para 12 anos e removeu da carta a proibição de diferenciação de salário por idade, que previa a Constituição de 1946.

Em 1969, uma Emenda Constitucional coloca a obrigatoriedade de ensino público às crianças de 7 a 14 anos.

Em 1985, após o retorno da democracia no Brasil, diversas organizações não governamentais (ONGS) que trabalham para apoiar crianças, criaram um movimento em favor dos meninos e meninas de rua.

O movimento teve como prioridade, o resgate dos direitos da criança. Com apoio dos meios de comunicação, da Igreja, das áreas médica e legal, esse movimento no último semestre de 1986, apresentou mais de três mil artigos em revistas, jornais e diversos programas de televisão sobre os direitos da criança.

Em maio de 1987, a Assembléia Constituinte recebeu uma petição assinada por 1,3 milhões de brasileiros que davam apoio à inclusão dos direitos das criança na nova Constituição. Tais mudanças foram realizadas na nova Carta.

Entre vários temas afetos à área social, a questão da criança encontra, na Constituição Federal de 1988, respalda sem precedentes se comparada ao tratamento dado à temática infanto-juvenil pelas Cartas anteriores.

A proteção constitucional da criança e do adolescente está presente no Título II dos direitos e garantias fundamentais, especificamente quando cuida em seu capítulo II dos direitos sociais, inicialmente em seu artigo 6º, cujo caput tem o seguinte enunciado:

“São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção a maternidade e a infância,........., na forma desta Constituição”

Já no artigo 7° do mesmo capítulo, inciso XXXIII, o Constituinte foi explícito quando previu para os menores de 18 anos a vedação a qualquer trabalho noturno, perigoso ou insalubre, e a proibição de qualquer espécie de trabalho a menores de 16 anos.

“Artigo 7°, inciso XXXIII - Proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos”

Vale considerar que a presente redação supra tem suporte na Emenda Constitucional n° 20, de autoria do Senador José Eduardo Dutra, publicada no DOU de 16.12.98, que modifica o art.7°, inciso XXXIII da Constituição Federal, vindo elevar a idade mínima para admissão no emprego de quatorze para dezesseis anos, com isso, alterando o que dispõe o art.60 da Lei 8069/90.
Esse dispositivo constitucional prevê a permissibilidade do trabalho ao maior de 14 e menor de 16 anos na qualidade de aprendiz. Sobre esse tema, desenvolveremos com mais profundidade, quando cuidarmos do Estatuto da Criança e do Adolescente.

A Seção IV do Capítulo II do Título VIII, que cuida da ordem social, no item da assistência social e explicitamente no artigo 203, define que ao Estado caberá proteção da família e da maternidade. Com isso, o constituinte deixou claro que essa proteção tem como destinatário a infância e adolescência, bem como amparo às crianças e adolescentes carentes em seus incisos I e II.

“Art.203. – A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independente da contribuição social, e tem por objetivos:
I – a proteção à família, ..., à infância, à adolescência...;
II – o amparo às crianças e adolescentes carentes; “

A Constituição Federal de 1988 vigente, voltada para a solução dos problemas sociais, previu também no Capítulo VII do citado Título VIII, o tema sobre a família, criança e o adolescente, nos seguintes dispositivos:

“Artigo 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

O citado artigo, em seu parágrafo 1°, impõe ao Estado o dever de promover programas de assistência integral à saúde da criança e do adolescente, admitindo a participação de entidades não governamentais, prevendo, inclusive, a aplicação de percentual de recursos públicos destinados à saúde na assistência materno-infantil bem como integração social do adolescente portador de deficiência, na expressão dos incisos I e II do citado parágrafo 1° do artigo 227.
Oportuno lembrar que o parágrafo 3° do indigitado artigo 227, também prevê, no inciso III, “garantia de acesso do trabalhador adolescente à escola”, e em seu inciso VI está previsto “O estímulo do Poder Público através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente, órfão ou abandonado.” conforme dispõem os artigos 33 a 35 da Lei 8069/90.

A Carta Magna vai mais longe, quando no inciso VII do apontado parágrafo 3º do artigo 227 em exame, cuida da criação de “Programas de prevenção e atendimento especializado à criança e ao adolescente dependente de entorpecentes e drogas afins”.

Não menor foi a preocupação do constituinte em determinar no parágrafo 4º do artigo em estudo, que a lei deverá punir severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente, conforme acontece nos artigos 217, 218 e 224 do Código Penal, e como previsto na Lei 8069/90, de acordo com as referências previstas em seus artigos 225 e seguintes.

Em que pese a controvertida questão, diante da doutrina e dos fatos sobre a maioridade penal, a Constituição definiu, em seu artigo 228, regulamentado no artigo 27 do Código Penal, que:

“Artigo 228 – São penalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial” .

A Legislação especial, a qual se refere o texto constitucional, é a prevista na Lei 8069/90.

O art. 104 do ECA prevê a inimputabilidade ao menor de 18 anos.

O art. 27 do Código Penal tem idêntica redação ao texto constitucional, no tocante à maioridade do adolescente.
Como se observa, há perfeita sintonia nos diversos diplomas jurídicos quanto à maioridade penal do adolescente.

Quanto a outros tipos de maioridade, face à diversidade da natureza, vale considerar que ela oferece variações tais como: dezesseis anos para a legislação trabalhista e vinte e um anos para a maioridade civil.

Diploma Legislativo, considerado no Brasil e no exterior como dos maiores e mais significativos avanços, no campo social, mormente por seu cunho preventivo, ao lado de seu aspecto resolutivo, a Lei 8069, de 13 de julho de 1990, conhecido como Estatuto da Criança e do Adolescente, em que pese a resistência de segmentos de correntes conservadoras, pode ser considerado, sem exagero, como um dos diplomas socialmente mais avançados do mundo.

Uma das mudanças mais relevantes do ECA refere-se a defesa jurídico - social de crianças e adolescentes. Em termos de método, para uma ação mais efetiva, o ECA desloca a tendência assistencialista prevalecente em programas destinados ao público infanto-juvenil, e a substitui por propostas de caráter sócio-educativo, de cunho emancipatório.

Face às limitações de tempo e de espaço no texto, torna-se impossível tratar, ainda que sumariamente, de toda a matéria, no que tange aos direitos e deveres da criança e do adolescente, objetivando a sua proteção integral, em prestando prioridade, sem desprezo quanto aos demais dispositivos legais contidos no diploma vigente, valendo tão somente ressaltar aqueles comportamentos que são considerados frontais desrespeitos aos direitos fundamentais da criança e do adolescente.

Institucionalmente, o ECA criou os Conselhos Tutelares (art.131 e seguintes) para garantir a aplicação eficaz das propostas estatutárias. Órgãos permanentes e autônomos, não jurisdicionais, são encarregados pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos das crianças e adolescentes. Sempre que esses direitos forem violados, por ação ou omissão do Estado ou da sociedade, caberá aos Conselhos Tutelares adotar medidas de proteção cabíveis, ajuizando, quando necessário, uma representação junto à autoridade judiciária.

Nomenclatura: a mudança substancial da expressão “menor”, previsto na lei 6697/79, mais conhecida como Código de Menores, para expressão “criança e adolescente” não é apenas uma questão semântica, por duas razões: primeiro porque a legislação anterior não fazia qualquer distinção quanto à idade do referido menor, enquanto que o Estatuto da Criança e do Adolescente em seu art. 2°, denomina “criança” a pessoa de até 12 anos de idade incompletos e nomina “adolescente” aquele entre 12 e 18 anos.

“Art. 2°- Considera-se criança, para os efeitos desta lei, a pessoa até doze anos, de idade incompletos, e adolescente aquele entre doze e dezoito anos de idade.”

A segunda razão da pertinência da mudança da nomenclatura prende-se ao fato de que a expressão “menor” tornou-se, através dos tempos e dos fatos, estigmatizadora, intimamente ligada à doutrina da “situação irregular”, ainda porque esta evoluiu substancialmente para à doutrina da “proteção integral”, também denominada de “doutrina das Nações Unidas para proteção dos direitos da infância”.

As colocações apresentadas no texto não se constroem por si só. Elas são tecidas por dentro das relações que coletivamente estabelecemos. Nesta perspectiva, educar crianças e jovens para a solidariedade, romper preconceitos no cotidiano do trabalho escolar, dar atenção especial aos primeiros anos de escolarização são desafios postos aos que trabalham em prol da criança e do adolescente. O espaço para a formação de crianças e adolescentes pode se constituir em local privilegiado onde se possa transmitir uma imagem de futuro que não se constitua simplesmente como presente melhorado, mas que incorpore os sonhos e valores de uma sociedade efetivamente justa e igualitária. Nesse sentido, as pesquisas sobre infância são uma contribuição fundamental, ao lado das políticas públicas e dos movimentos sociais, para a conquista dos direitos de crianças e adolescentes.