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Advogado, Membro da Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da OAB/RJ, Jornalista, Consultor de Políticas Públicas e Gestor em Segurança, Cursou Psicologia Jurídica na UERJ, Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino - Buenos Aires – ARG; Oficial da Reserva do Exército.

23 de agosto de 2005

A ÉTICA NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

As muitas crises que abalam o mundo hodierno, não constituem senão múltiplos aspectos de uma só crise fundamental, que tem como campo de ação o próprio homem. A evolução da sociedade moderna tem deflagrado uma grave crise ética, o pluralismo ético, tese característica dos pós-modernos, não somente um fato inevitável, mas um valor e uma garantia das liberdades individuais e das diferenças culturais.

O sinais desta crise são evidentes. A opinião pública tomou consciência dela, sobretudo com relação à ética pública, traduzida na falta de honradez na vida política, profissional e particular. Impressionantes são os níveis de violência, discriminação social, abuso do poder, corrupção, permissividade, cinismo e impunidade. Chega-se à deformação das consciências que aceitam como normal ou inevitável o que não tem nenhuma justificativa ética. A concepção relativista da verdade e a concepção extremamente individualista da liberdade levam à aceitação de práticas depreciativas da vida humana, tais como a família, o aborto, a eutanásia, o uso de drogas, a busca desenfreada por bens materiais e a negação da solidariedade.

A crise ética está profundamente ligada a um longo processo histórico. O problema é antes de tudo, compreender as raízes desta crise, que afeta a sociedade moderna em geral, especificamente no meio urbano.

O termo ética é de origem grega (ETHOS). O ser humano se manifesta não apenas na natureza, mas também na ação ou práxis humana, no ETHOS, isto é, hábitos, costumes e instituições produzidos pela sociedade. O ETHOS se refere à morada e a organização de um povo ou de toda a sociedade. Diferentemente da natureza, caracterizada pela necessidade e pela repetição do mesmo, o ETHOS é o espaço da liberdade, da diferença. E esta liberdade não é meramente subjetiva, embora toda pessoa humana busque sua própria felicidade. A felicidade não consiste apenas em fazer o próprio gosto arbitrariamente, mas em buscar a própria realização, isto é, o que é bom, o que conforme à natureza humana. E o próprio ETHOS da sociedade em que o homem vive (seus costumes, suas leis e instituições) aponta o que é bom.

Numa sociedade tradicional, ética e religião estão estreitamente associadas e a Igreja às vezes associada ao poder, se torna guardiã da moral, exercendo um controle rigoroso sobre a conduta dos cidadãos. Na sociedade moderna, a ética caminhou para a autonomia, distinguindo-se do religioso e do sagrado. Este processo de secularização representou uma grave crise da ética tradicional, ainda não resolvida, especialmente da convicção iluminista e idealista da universalidade da razão.

As descobertas da etnologia e da antropologia põem em relevo a existência de culturas diversas. O pluralismo ético, que é uma das características da sociedade moderna, consiste em tomar consciência de que as diversas etnias, civilizações e culturas se inspiram em valores ou princípios éticos diferentes. Prevalece a convicção da modernidade de que a razão humana, considerada única e universal pelo pensamento iluminista, poderia reconduzir a ética a princípios igualmente universais e aceitáveis por todos.

A pós-modernidade, ao contrario, suspeita dessa razão universal, a qual atribui pretensões totalitárias, historicamente responsáveis pelo esmagamento ou tentativa de eliminação das diferenças e das minorias e em ultima análise da liberdade individual. Teoriza ao invés as vantagens praticas do pluralismo ético enquanto este reconhece igual valor a todas as formas concretas e particulares de ETHOS, assumidas por indivíduos ou grupos. Além disso, considera inviável a superação teórica das diferenças éticas, pois não haveria ética universal capaz de unificá-las. A afirmação deste pluralismo ético absoluto de que “nenhuma proposição universal é válida” é em si mesma contraditória, pois nega validade universal à própria afirmação. Assim não se pode afirmar a impossibilidade de uma ética universal embora ainda não se possa dizer agora qual seja essa ética.

Mais recentemente, a própria consciência tem sido posta em dúvida. Enquanto na sociedade tradicional ela é o lugar onde a exigência ética se manifesta com mais evidencia e vigor, indicando o que é bom e exigindo uma ação coerente, hoje é vista por muitos como nada mais do que uma forma de censura da liberdade.

Conseqüentemente, ao longo do processo histórico, as esferas da sociedade, como a política a religião a arte a ciência vão adquirindo sua própria autonomia. Nesta sociedade transformada e moderna a ética e a religião perdem a hegemonia que exerciam sobre a sociedade tradicional.

Mais radicalmente com o avançar do processo a economia globalizada assume papel dominante e subordina a seus interesses as outras esferas sociais inclusive a ética. A tendência inscrita nesta sociedade moderna é a de organizar e administrar a vida social segundo regras meramente técnicas de acordo com os interesses do sistema econômico, reduzindo o ser humano apenas a algo fabricado por esse mesmo sistema. A única regra é a procura do melhor produto, no sentido do mais eficiente do ponto de vista estritamente econômico isto é o que dá mais lucro. Não o melhor produto com relação a valores humanos e éticos. É a supressão pratica da ética.


Influenciada e condicionada em sentidos diversos, por fatores extrínsecos de toda ordem (culturais, sociais, econômicos, étnicos, geográficos e etc...) e seguindo por vezes caminhos bem sinuosos a crise da ética vai progredindo incessantemente para o fim das relações na sociedade contemporânea.